O inquérito sobre a venda de sentenças, que atinge cinco desembargadores da alta cúpula do Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul (TJ-MS), está sendo analisado pelo Supremo Tribunal Federal (STF).
O caso, que envolve todos os setores da justiça no estado, está sob a responsabilidade do ministro Cristiano Zanin, após a revelação de que um dos investigados na operação Última Ratio é suspeita de negociar decisões de ministros do Superior Tribunal de Justiça (STJ).
Preocupado com a gravidade do caso, o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Luís Roberto Barroso, afirmou em uma entrevista à *Folha de S.Paulo* que ‘não haverá tolerância ou condescendência’ caso seja confirmado a venda de decisões judiciais no Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul (TJ-MS).
"A integridade pessoal, a competência técnica e a imparcialidade são os atributos que dão legitimidade ao Poder Judiciário. Pré-julgamentos ou julgamentos precipitados são incabíveis, mas onde quer que existam coisas erradas, não haverá tolerância ou condescendência", diz Barroso à coluna da Mônica Bergamo.
Na tarde de sexta-feira (25), o Supremo Tribunal Federal (STF) informou sobre o afastamento de um segundo supervisor suspeito de participar do esquema.
"Com essa medida, o tribunal expande as investigações que podem resultar em novos procedimentos internos. Os processos estão sendo complementados por dados compartilhados pela Polícia Federal e pela Corregedoria Nacional de Justiça", afirmou o órgão em nota de imprensa.
A operação que revoltou a sociedade sul-mato-grossense ocorreu na última quinta-feira (24), quando agentes da Polícia Federal cumpriram mandatos de busca e apreensão contra cinco desembargadores.
Os magistrados suspeitos são Vladimir Abreu da Silva, Marcos José de Brito Rodrigues, Sideni Soncini Pimentel e Alexandre Aguiar Bastos.
Outro magistrado que também é suspeito de participar do esquema de venda de sentenças e que está afastado por 180 dias é o presidente do TJ-MS, Sérgio Fernandes Martins.
Todos os desembargadores suspeitos terão que cumprir medidas como a proibição de acesso às dependências de órgãos públicos, aplicação de comunicação entre os investigados e uso de tornozeleira eletrônica.
A operação Última Ratio veio à tona após o início das investigações sobre o assassinato do advogado Roberto Zampieri, no fim do ano passado.
Em mensagens descobertas no aparelho celular de Zampieri, diversas conversas sobre a venda de decisões em gabinetes de quatro ministros foram descobertas.
Diante dessas informações, a Polícia Federal realizou outra operação, quebrando os sigilos do lobista e do empresário Anderson de Oliveira Gonçalves, que é investigado em Mato Grosso desde 2007 por lavagem de dinheiro, usurpação de função pública e, mais recentemente, por intervenção em decisões na penúltima instância Ele também é um dos suspeitos de venda de decisões judiciais em gabinetes do STJ.
Ainda de acordo com a *Folha de S.Paulo*, Anderson passou a ser investigado após o assassinato do advogado Roberto Zampieri, conhecido como 'lobista dos tribunais', que foi morto com 12 tiros na fachada de seu escritório em Cuiabá (MT) em dezembro do ano passado
Durante as investigações, os policiais tiveram acesso ao celular de Zampieri e encontraram milhares de mensagens que revelaram o esquema de venda de sentenças.
A operação da Polícia Federal aponta que existe um grande esquema de corrupção que se arrasta há mais de uma década na cúpula dos poderes estaduais.
Ao todo, a Polícia Federal cumpriu 44 mandados de busca e apreensão, em diversos locais, como residências de investigados e seus familiares, o prédio do TJMS, a sede do Tribunal de Contas do Estado (TCE), o fórum e escritórios de advocacia. Além de Campo Grande, alvos são investigados em Brasília, São Paulo e Cuiabá.
Durante cumprimento de mandados de busca e apreensão nesta manhã, foram encontrados R$ 2,7 milhões, além de notas de euro e dólar, na casa de um dos desembargadores alvos da investigação.
Na sede do Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul, policiais apreenderam um cofre e uma "bolsa gigante" que estavam no interior do prédio.
A Polícia Federal pediu a prisão preventiva de alguns investigados, mas a Justiça negou e decretou apenas a suspensão do exercício do cargo ou função pública de cinco desembargadores, conselheiro do TCE e servidor do TJMS, pelo prazo inicial de 180 dias.
Desta forma, durante o prazo, eles ficam proibidos de acessar as dependências do Tribunal de Justiça e de uitilizar os serviços da Corte, assim como são proibidos de manter contato com os funcionários do local.
"Para viabilizar a fiscalização do cumprimento das medidas, determino que seja realizada a monitoração eletrônica", diz a decisão.
Usarão tornozeleira eletrônica os seguintes investigados:
QUBRA DE SIGILO
No topo da lista estão os desembargadores Sérgio Martins, Vladimir Abreu da Silva, Sideni Soncini Pimentel, Alexandre Bastos e Marcos José de Brito Rodrigues.
A lista inclui ainda advogados, filhos de desembargadores, ex-desembargadores, advogados lobistas, empresários e empresas, tais como:
BALCÃO DE NEGÓCIOS
As vendas de decisões, conhecidas como vendas de sentenças, ocorriam de diversas formas e em vários processos.
Um caso emblemático envolve desembargadores do TJMS, que aceitaram decisões baseadas em uma escritura falsa lavrada no estado do Paraná, usada para transferir a propriedade de uma fazenda em Maracaju.
Outro caso envolve o desembargador Marcos José de Brito Rodrigues, que ajudou um colega do Ministério Público de Mato Grosso do Sul (MPMS), o procurador de Justiça Marco Antônio Sottoriva, que havia feito um mau negócio na compra de uma fazenda. Sottoriva queria desistir da compra e enfrentava um contencioso de R$ 5 milhões na Justiça com a outra parte.
Brito Rodrigues decidiu sem ler o processo, delegando a seu assessor a elaboração da decisão, e atendeu ao pedido do amigo.
Posteriormente, Sottoriva conseguiu um acordo para se livrar de pagar parcelas, aluguéis e lucros cessantes no desfazimento do negócio, agradecendo a Brito pela decisão favorável: “Graças a Deus e ao seu trabalho”.
Há também o caso do ex-prefeito de Bodoquena, Jun Iti Hada, que pediu para parcelar a compra de uma decisão (para rescindir uma sentença em que ele havia sido condenado) em duas vezes, além de decisões favoráveis para soltar traficantes.
** Colaboração de Eduardo Miranda e Glauccea Vaccari
João Gabriel Vilalba/CorreioDoEstado